on 24 agosto 2010
Olho para o chão. Contemplo os estilhaços. Estão espalhados por todo o lado, à minha volta. Tenho medo de me mexer, não vá eu pisar algum. Inspiro profundamente e ganho coragem para a hercúlea tarefa de os apanhar do chão. Mais uma vez.
Apanho-os, pego com cuidado, um por um, nos pedaços de mim mesma. Observo-os com atenção, tentando perceber até que ponto sobreviveram. Alguns devolvem-me um reflexo que me é estranho, como se não conseguisse reconhecer-me nele. Junto-os a todos e começo a montar o puzzle.
Cabeça, tronco e membros. Estes são os mais fáceis. Umas quantas nódoas negras, um ou outro corte. Nada que um penso rápido e uns dias de repouso não curem. O pior vem depois. As brechas na armadura, a vulnerabilidade cada vez mais à tona. As camadas protectoras a desaparecerem a cada nova queda. Parece-me também que, desta vez, ou ou outro sonho conseguiram fugir. Isto de cair constantemente ao chão começa a deixar sequelas. E começa a não ter muita piada.
Começo, então, a montar o puzzle. E já o conheço quase de cor. As linhas, os contornos, os fios do pensamento. Já arranjei maneira de dar voltas, contornar os hábitos, exaltar as virtudes, remeter os receios para os recantos mais escuros. No final, por mais que tente fazer as coisas de forma diferente, o resultado final é sempre o mesmo.
E cá estou, inteira outra vez, pronta para a luta.
E é quando me meto ao caminho que me apercebo: há um pedaço em mim que não me pertence...apanhei, sem ter reparado, um pedaço de outro alguém.
4 comments:
E é esse que pedaço diferente que vai servir para a renovação!!
:)
Gostei. Do texto. E do comentário.
Quantas vezes serems capazes de nos pedaçarmos? Over and over again até deixarmos de nos reconhecer. As peças passam a encaixar noutros sitios de folgadas que ficam. Metamorfoseadas pelas outras que trazem consigo. Outros pedaços. Não reparados. Não notados. Não identificados.
Estou louca com o pedarçarmos... é preciso adicionar essa palavra ao dicionário, ou pelo menos a um texto, com honras de primeira página. Aqui deixo o desafio!:-)
Acho que esta história dos pedaços (próprios ou trocados) e do pedaçarmos ainda vai dar pano para mangas, que é como quem diz, ideias para muitos posts (aqui e não só!)
:)
...to be continued.
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