Fechado para Balanço


Fim do ano, tempo do fecho de contas, do balanço emocional da soma dos dias, das horas e dos minutos que se acumularam e se escaparam.

Traçar planos, tentar acender rastilhos que se foram lentamente apagando. Regar tudo muito bem na última noite do ano. Erguer a cabeça, enfrentar mais um ano, um longo ano. Com os seus demónios, os seus salvadores, os seus penitentes.

Eu estarei provavelmente no meio dos dias, entre estações, a ver os comboios passar e a traçar mentalmente os movimentos musculares para por-me em acção, para correr até não ter fôlego.

Até lá, fecho na cerca o ano de 2008. Fechado para balanço.

Feliz Natal


Aos que entraram, aos que saíram, aos que passaram e não ficaram, aos que passaram ao largo, aos que persistem na minha vida.

Quer fiquem, quer partam, quer passem de mansinho, quer se insinuem cada vez mais. Todos, juntos, fazem a soma daquilo que me rodeia, que se me cola à pele e ao pensamento.

Presentes, ausentes, intermitentes.

A todos, sem excepção, o desejo de luz e calor neste Natal.

Cortes

Passo em revista a minha agenda de 2008. Uma Moleskine, preta, a abarrotar de encontros, afazeres, ideias, pensamentos, rabiscos, bilhetes de cinema, de museus, de locais visitados ou a visitar. Algures lá pelo meio encontro isto:

Um corte no dedo, profundo. Talvez não tão profundo quanto isso, não o suficiente para se fazer notar na porta de uma triagem onde casos de degradação humana se arrastam contra paredes velhas, nuas e frias. Mas outro e mais profundo, um corte nas certezas do passado, nos dados adquiridos e nas ridículas ideias feitas. Um corte invisível que me deixou um sorriso de espanto e felicidade.

Covers

Há uns tempos atrás, andava eu a percorrer os corredores da Fnac em depressão absoluta por tudo aquilo que não podia comprar, quando apanhei pedaços de uma conversa entre dois rapazes. Falavam de uma banda (escapa-me agora esse detalhe) que um deles, aparentemente, nunca tinha ouvido falar antes. O outro retorquiu: "sabes, aqueles que fizeram uma cover de uma música do Michael Jackson?". O olhar de superioridade que o outro mostrou dizia tudo, mas acrescentou, peremptoriamente: Covers??! Isso é mesmo coisa de quem não tem talento nem originalidade."

Caríssimo,
Quando alguém pega numa música e resolve dar-lhe uma nova roupagem, chamamos-lhe uma cover. Não é plágio, não é falta de originalidade, muito menos de talento. Em casos de grande genialidade, podem ser verdadeiras obras primas. Aqui ficam apenas uns meros exemplos:

Hallellujah, Jeff Buckley (original de Leonard Cohen)
Rocket Man, David Fonseca (original Elton John)
Read My Mind, David Fonseca (original The Killers)
Mad World, Gary Jules (original Tears for Fears)
Hurt, Johnny Cash (original de Nine Inch Nails)
To Love Somebody, Ray LaMontagne e Damien Rice (original Bee Gees)

Perguntas sem resposta

Se alguém nos entra pela porta da clínica dentária adentro e pergunta se pode deixar o exame do Papanicolau, o que é que se responde?

Reformulando, como é que se responde sem nos partirmos a rir na cara da senhora?

O Natal a chegar...


Salvem os Ricos, Contemporâneos & Friends
(making of em http://pftv.sapo.pt/?v=JNWqAn9SkNzDSwCJFjzZ)

...

Domingo à tarde. Doses industriais de anúncios a brinquedos. Bem-vindos ao mundo encantado do consumismo. Mais os telemóveis, versão adulta do "vá lá, Pai Natal, vá lá...". Filmes da Disney num lado, o Ben-Hur no outro. Sem dúvida, já cheira a Natal.

Juntando a chuva e a falta de planos, encontro a solução mágica: DORMIR A SESTA.

Há lá coisa melhor que ceder à preguiça?!

Story #3 - Part I

Sinto as tuas mãos. As tuas mãos em mim, a cravarem-me a pele dos braços. Ponho os olhos no céu, na luz de um céu azul cheio de esperanças, e sorrio. Nos teus olhos há desesperos, agonia, desencanto. Mas em mim há um mundo de possibilidades.
Não é fácil perder alguém e reunir as forças para continuar pela vida fora. Perdendo pessoas de tempos a tempos, com a certeza apenas que não voltam. Abrem-se as comportas da alma e os sonhos deslizam por nós a fora, torrente imaginada de beijos e sorrisos. De palavras por dizer e silêncios por escutar. Daí em diante, são escuros os dias até que um dia (não necessariamente um dia especial) vemos com espanto que o sol continua a brilhar. Mais nuvem, menos nuvem, dentro ou fora de nós, está onde sempre esteve.

Mas agora, agora sinto unhas de ferro nos meus braços e penso que nada do que possa dizer neste segundo te fará olhar para o mesmo céu que o meu. O céu que vejo agora enquanto me molhas a blusa de lágrimas, lágrimas de sal que se estendem em novos rios. Mas que vão secar. Eu sei que sim.

E digo-te apenas: “Eu sei”.

...


Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que se não pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que eu quero.
in Passagem das Horas, Álvaro de Campos

É, na maioria das vezes, na genialidade e na simplicidade das palavras dos outros que encontro redutos perdidos e pontes em ruínas. Para tudo o que trago que cá dentro...

Speak your mind


"Todo o indivíduo tem direito a liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão."
Artigo 19.º, Declaração Universal dos Direitos do Homem

Love it or hate it


The Veils, Calliope
(ainda que a minha canção de eleição seja "Pan"...mas não há vídeo para essa...)

Sweet dreams


Dreams in Colour, David Fonseca

Simon says...

“Essentially we all live two different lives simultaneously. One of them is made up of all the plans, hopes, ambitions and expectations that we have woven around ourselves. The other consists in just being alive. Sometimes it is extremely hard to switch from one to the other, from expectations to reality.”
Ted Simon, in “Dreaming of Jupiter”

Janelas


Há janelas fechadas à minha frente. E morrem no fim do dia, perante os meus olhos e através da lente de uma máquina. Janelas que ardem num lugar vazio, num lugar onde quase consigo ainda ouvir os passos apressados de quem ainda vai embalado no sono. Onde milhares de pessoas gelavam pela manhã junto ao rio, à espera de um barco, à espera de um comboio, à espera de um autocarro. Ardem estas janelas e já tão depressa se extinguem as suas chamas. São cinzas tudo o que resta. Destas janelas e deste lugar.

Ver o mar...


Não a vontade, o desejo ou o capricho. Antes a necessidade pura e simples de ver o mar. Depois de falhadas várias tentativas, acabo por encontrar a solidão e estranheza de um banco de jardim frente a um mar imenso e revolto. Não podia pedir mais do que isto.

Banksy




Seja ele quem for (a sua identidade ainda não foi apurada com 100% certezas), este homem é um artista. Não foi fácil escolher duas imagens para por aqui, por isso conheçam mais em www.banksy.co.uk/

Solnado

Pergunta: “Qual é a recordação mais antiga que tem de Lisboa?”
Resposta: “No dia em que nasci, o meu pai mostrou-me Lisboa inteira. Perguntou se eu tinha gostado. ‘Já conhecia', disse eu. ‘Deus já me tinha contado tudo. E ontem trouxe-me o DVD.”

Resposta de Raul Solnado em entrevista à Time Out nº52

Under Pressure

Baikal

Leio numa revista de viagens, a propósito do Transiberiano, a “mãe” de todas as viagens, ao longo de dois continentes, 10 mil quilómetros e oito fusos horários:

“A paragem seguinte é, para a maior parte dos viajantes, o ponto alto de todo o Transiberiano. O lago Baikal, a maior concentração de água doce do mundo, proporciona vistas fantásticas e acesso a algumas das comunidades mais isoladas da Rússia. Uma geografia montanhosa dá o enquadramento perfeito ao ‘mar da Sibéria’ – uma extensão de água tremenda que, no Verão, se enche de banhistas, campistas e amantes da natureza e no Inverno congela totalmente. Este foi também o troço do Transiberiano que mais tempo demorou a construir. Foi preciso levantar pontes e abrir mais de 30 túneis para que o comboio pudesse passar. Não há outro sítio onde a construção da via férrea tenha ceifado tantas vidas. Durante a guerra civil, por exemplo, e dada a necessidade de fazer chegar soldados e munições ao mar do Japão, a ferrovia ainda não estava concluída e uma parte do percurso era feita de barco. Mas o gelo era tão espesso que os militares decidiram assentar os carris por cima do lago. Dois comboios inteiros afundaram-se durante essa travessia, o que causou a morte de centenas de pessoas.” (in Volta ao Mundo nº 1698)

Ah…a ambição sem limites do Homem…

Qual é a cor do céu?


Gosto dos finais de tarde, do entardecer, daquele momento intermédio em que a hora já é tardia, os candeeiros já estão acesos mas no céu permanecem uma profusão de cores capazes de desarmar qualquer um. Tenho o privilégio de observar esses céus (normalmente no fim do Verão) aqui mesmo no parapeito da janela do meu quarto. Às vezes eles apanham-me desprevenida noutros locais e fico boquiaberta, num transe perante um festim da Natureza, enquanto alguém ao meu lado vai falando sem que eu consiga seguir todo o percurso natural das palavras. Não é por mal, é só algo que me ultrapassa e que, algures no fundo da minha mente, me traz de volta a sensação inocente e poderosa de que amanhã pode mesmo vir a ser um dia melhor.

Fado

No meu último dia de umas férias demasiado curtas, resolvo-me a aproveitar o dia em condições e a vaguear por Lisboa. Ainda no espírito da recente viagem, uma visita ao Museu do Fado seguida de deambulações por Alfama pareceu-me uma ideia agradável.

À porta do Museu um senhor diz-me: "Bom dia. Diga?". Estou à porta do Museu. Repito, à porta. Respondo um redundante "venho visitar o Museu" e, com um sorriso aberto o senhor responde..."Ah, pois! Está fechado. Para obras". Perante a minha cara de espanto o senhor concluí: "já está em obras há muito tempo. Não sabia?".

Não, eu não sabia. Obviamente, eu não sabia. Se eu não tivesse andado à procura de informações sobre o museu, horários e afins, eu até aceitava a pergunta. Mas andei.

"Deve abrir lá para 6 ou 7 ou 8 de Outubro. Talvez, sim, por aí. Mas a loja do Museu está aberta."

O idiota persistiu, de sorriso em riste. E eu rumei a Alfama com mais uma prova irrefutável do bem que as coisas funcionam por aqui. Deve ser o nosso Fado.

O regresso


Aterrei. Deixei as nuvens e desci à terra depois de cinco dias a sonhar.

Até já

Finalmente, mais uma viagem na minha vida. Seja qual for o destino, levo comigo as palavras de Ted Simon.

“In spite of wars and tourism and pictures by satellite, the world is just the same size it ever was. It is awesome to think how much of it I will never see. It is no trick to go round the world these days, you can pay a lot of money and fly round it non-stop in less than forty-eight hours, but to know it, to smell it and feel it between your toes you have to crawl. There is no other way. Not flying, not floating. You have to stay on the ground and swallow the bugs as you go. Then the world is immense. The best you can do is trace your long, infinitesimally thin line through the dust and extrapolate.”

Até já.

"I'm Yours"

Por pirosa que a considerem, longe do que habitualmente oiço e seguindo mesmo aquilo que um amigo chama de "a rebanhada", elejo esta como a música oficial de um Verão que se aproxima do fim. Pela leveza, pela doçura e por a cantar a plenos pulmões, de vidros abertos enquanto conduzo para o trabalho.

Gorila

Há uns tempos atrás comprei pastilhas Gorila.Pelo saudosismo, pela nostalgia de mastigar aquelas pedras de mentol ou banana, às vezes perder a cabeça e comer duas de cada vez. Estas vinham num novo formato, com uma embalagem apelativa. Prometiam sabor a canela, sem açúcar, baixo em calorias. E com flúor! De igual às de antigamente, só mesmo o facto de perderem o sabor em menos de quinze segundos.
As Gorila faziam parte dos meus dias. Na altura era normal ir ao café com os pais e pedir uma. Não mais do que isso e nunca, certamente, pacotes de batatas fritas e afins. As Gorila custavam cinco escudos mas a marca que deixaram no imaginário infantil deste país não tem preço. E eram grandes, ridiculamente duras e perdiam o sabor em menos de nada. Mas eram "as" pastilhas. E agora, com um pacote de Gorila de canela, sem açúcar, baixo em calorias (e com flúor!) na mão, limito-me a lamentar que algumas coisas já não sejam como antes.

Ray

Um dos meus mais recentes vícios musicais teima em não abandonar os meus phones. Chama-se Ray LaMontagne e é assombroso. Aqui, deixo-vos uma cover partilhada a meia voz e guitarra com (mais um) dos meus eleitos - Damien Rice.
Sim, são dois freaks. E sim, são geniais.

Story #2

Olho para o teu corpo no chão e sinto liberdade a correr-me pelas veias. Literalmente. A arma que tenho na mão confirma a realidade. Ainda bem. Estava com medo que fosse só um sonho.
Na aparelhagem, os Muse tocam “Feeling Good”. Gostavas tanto de ouvi-los. Ficavas numa espécie de transe e deixavas os acordes fortes correrem por ti como uma corrente eléctrica. Ou talvez fosse só essa brancura de morte a chegar finalmente ao teu coração e ao teu cérebro, a turvar-te o olhar e a distorcer-te o sorriso pelo prazer desse vício. Gostavas de arranjar essas desculpas patéticas para me empurrares de um lado para o outro com as tuas palavras ou com as tuas mãos. Agora já não te podes rir de cada vez que ouvires esta música (porque agora sou eu que sorrio quando a oiço). Nem podes entrar mais em mim.
Não estás morto, mas para mim é como se estivesses porque o meu medo morreu e por isso tu também. E tu sabes disso.
Gostava de saber como é que vais explicar nas urgências que levaste um tiro na perna. E que estavas com muito medo de mim quando isso aconteceu.

"Roll the Dice"



(do grande, genial e louco Charles Bukowki, "Roll the Dice")

Story #1

O relógio na parede tem três mostradores. Um, grande, com os seus dois ponteiros negros a assinalar a dolorosa passagem dos minutos. Os outros dois, mais pequenos, marcam a hora actual em Nova Iorque e Hong Kong. Tudo isto faria sentido se eu estivesse num aeroporto, a caminho de um qualquer destino, longe ou perto, tanto faz, desde que seja diferente desta realidade. Ou se eu estivesse num quarto de hotel e aguardasse o nascer do dia no outro lado do mundo, para poder agarrar no telefone e ligar a alguém só para ouvir a sua voz e perguntar “como está o tempo aí?” e “dormiste bem?”. Aí sim, este relógio faria algum sentido. Não aqui, no meio de um café de cadeiras desconfortáveis, olhares cansados e cigarros apagados nos cinzeiros.
Sentar-me aqui, pedir uma bica e dar de caras com este relógio é perceber que há vida noutros mundos, noutros lados do mundo, onde tudo poderia ser diferente. Melhor ou pior. Tanto faz.
Estaria provavelmente sentada num outro café, em Nova Iorque ou Hong Kong, a pensar que a realidade dói. Onde quer que se esteja. Talvez estivesse apenas mais só, a lutar com os mesmos problemas. Ou talvez não. De qualquer forma, seria melhor. Desde que não fosse aqui, neste café, a olhar para as borras no fundo da chávena e a ver os sonhos morrerem, precisamente quando o relógio marca 14h45. Hora de Nova Iorque.

"Acordares"

Acordar. Sentir o corpo sair do torpor do sono, a mente a despertar e, por fim, os olhos a abrirem para as paredes do quarto. O despertador arrasta-me para mais um dia da minha vida. E se há dias em que custa mais largar de vez o sono e acordar para a realidade, há que arranjar forma de acreditar que vai ser um dia bom. Por isso,
há uns dias atrás mudei o toque do despertador. Agora, em vez do som anónimo e monótono de uma campainha, tenho uma música que me inspira e que me faz acreditar que as coisas vão mesmo correr bem - basta para isso sair da cama. E não é muito melhor acordar assim?



Agora acordo ao som dos brilhantes The Killers e deste "All the Things that I've Done". E a vocês? Que música escolheriam para vos inspirar ao acordar?

O início da viagem

Porque há coisas cá dentro que não me apetece mais calar.
Por causa das histórias, das trivialidades e das ideias que quero e gosto de partilhar.
Por causa das divagações, das emoções, dos dias de sol e das noites de insónia.
Por causa dos sons, das imagens, das letras que me ocupam o espírito.
Porque sim.
Por tudo isto, benvindos.